quarta-feira, 26 de outubro de 2016




Quinze dias descansando do trabalho oficial = quinze dias mergulhada em leituras e em um curso, convivendo com gente que acredita que palavras podem fazer mais que somente comunicar... E depois, mais alguns dias para refletir e colocar a cabeça no lugar, ou pelo menos para tentar! Se colocar tudo no papel, nem sei a quantas semanas estou sem blogar!

Nas férias eu concluí o curso à distância "Literature and Mental Health- Reading for Wellbeing" oferecido pela plataforma FutureLearn. Foi nesse curso que eu conheci a ReLit, uma rede dedicada a divulgar e promover a Biblioterapia no Reino Unido. Também nas férias eu participei do curso "Biblioterapia: bases conceituais, práticas e acervos", oferecido pela Cristiana Seixas, psicologa que tem certezas sobre a "potência terapeutica das palavras" e uma disposição para tocar seu projeto de vida que é uma lição para todos nós que também acreditamos que livros e pessoas deveriam estar sempre juntos.

Quanto ao pequeno projeto de ler as indicações da na Clínica Literária, durante as férias, li dois livros para começar o trabalho de entender como escolher um livro terapêutico, ou como reconhecer a "potência terapêutica" (adorei essa expressão!) de um livro. Os escolhidos foram Quarto, da Emma Donoghue, e A Redoma de Vidro, da Sylvia Plath

Novidades demais para poucos dias, não é para achar estranho que uma mente que divague com facilidade (a minha) esteja com sérias dificuldades de voltar para a rotina, mas aos poucos tudo se organiza! Está bem difícil voltar a blogar, mas aos poucos estou escrevendo posts novos, que devem entrar no blog essa semana e na semana que vem!


terça-feira, 27 de setembro de 2016

Setembro Amarelo - Madame Bovary

Este deveria ser mais um post sobre o setembro amarelo, sobre o suicídio e as formas como ele foi abordado na literatura. Ele não deixará de ser sobre isso, mas veremos muito mais em Madame Bovary!

A obra prima do escritor Gustave Flaubert (1821-1880), foi um escândalo na época de sua publicação por causa da abordagem do adultério, tendo sido o suicídio apresentado como um fim merecido para uma mulher adultera. Mas, os tempos mudaram e, se não é menos trágico ver um casamento ruindo e casais se separando, podemos dizer que nosso olhar se condicionou e hoje achamos esse evento (o adultério) um pouco menos escandaloso. O que nos leva direto ao tópico: como podemos ver Madame Bovary, hoje, em 2016?

O romance foi publicado em 1857, portanto, 159 anos atrás. Poderíamos argumentar que não é tanto tempo assim, mas, dadas as mudanças velozes que temos visto em nosso modo de vida nos últimos 20 anos, 159 anos atrás é muito tempo passando. Se naquela época toda a informação era publicada em livros, jornais e folhetins, hoje, uma verdadeira onda meios de comunicação invade nossas vidas, sejam eles escritos, fotografados, filmados por atores, jornalistas, artistas ou por gente como eu e você. 

Se restringirmos o assunto um pouco mais, veremos que consumimos informações, consumimos produtos e muitas vezes ainda consumimos informações sobre produtos. Estamos acostumados a frases de efeito como "tem que ter", vindas de blogs e posts de sites. Alguns destes, entretanto (sem contar em todos os trabalhos acadêmicos que visam estudar as relações de consumo), tem tomado conta das nossas telas tentando nos alertar sobre como temos consumido mal e gastado sem a devida parcimônia nosso tão suado dinheiro. 

Pois eu deveria lhes dizer que mesmo seguindo vários desses sites e blogs, nada me pareceu tão eficaz ao alertar sobre os malefícios do consumismo como a obra hoje tratada.


Mas, vamos começar a história de Emma pelo começo, por um questão de princípio. Emma foi educada em um colégio interno de freiras, e lia romances às escondidas, pois os mesmos eram proibidos, e só chegavam às mãos das alunas quando eram contrabandeados para dentro do colégio por alguma funcionária. É por meio desses romances que Emma começa a elaborar suas fantasias sobre o amor. Quando sai do colégio e vai morar com o seu pai, Emma conhece Charles Bovary, se casa com ele, ansiando encontrar naquela relação a alegria que (de acordo com os romances) o amor deveria proporcionar.

Mas não é bem isso que acontece, e, entediada, Emma retorna à leitura. Tendo um dia sido convidado para um baile em um castelo de um nobre que morava nas imediações de sua casa, o casal Bovary comparece e aquele se torna um divisor de águas para a vida da esposa. Diante da opulência da vida daquela pessoas, de uma sociedade à qual ela não pertence, Emma adoece, pesarosa por não ter feito uma escolha melhor no casamento. 

A família, então, se muda em busca de tratamento para Emma, mas o que acontece é que ela conhece um rapaz, e se deixa seduzir duplamente: por ele e pela ideia de felicidade que ela merece ter. Eu poderia continuar narrando a história com mais alguns detalhes, mas em resumo, Emma dialoga com duas ideias: merece ser mais amada e viver com maior conforto. Em busca disso, ela se arrisca em casos extraconjugais e gasta o dinheiro de seu marido em prazeres que são apenas para si própria: vestidos da ultima moda, novos estofamentos em poltronas e até mesmo alugando quartos em hotéis caros na cidade para passar o dia com seu último amante.

Mas, o dinheiro acaba-se rápido e aquela que viria a ser a precursora do tão assustador cartão de crédito é então usada para conseguir mais dinheiro (com juros que sempre crescem numa velocidade estonteante): a nota promissória. Emma assina uma nota atrás da outra, sempre prorrogando o pagamento e aumentando os juros. Da mesma forma que pagar sempre o mínimo da fatura não é uma boa ideia, renovar promissórias não também não foi, e quando Emma é levada à justiça por não honrar suas dívidas, sem ter de onde tirar mais recursos, se desespera e comete suicídio.

Confesso que encerrando a leitura dessa obra, não vejo muitas diferenças entre Emma e qualquer um de nós, que passeia pelas vitrines de um shopping, e acredita que merece um novo sapato, pois o dia foi ruim e você merece que ele termine bem. Ou, que compra um novo vestido por que o dia foi bom e você merece celebrar. Parece-me que nos últimos 159 anos estivemos trabalhando na elaboração de um vínculo indissolúvel entre sentimento e dinheiro. Consideramo-nos sempre merecedores de mais, como se o mundo fosse um devedor eterno e tivesse o dever de nos recompensar com coisas (mercadorias) por nossa maravilhosa existência. Como se nós fossemos uma dádiva para o mundo e não o contrário! 

Podemos tomar de Emma algumas lições práticas como: não gastar mais do que ganhamos, não gastar para melhorar de uma tristeza nem para celebrar uma conquista. Mas acima de tudo, deveríamos aprender com Emma a ter uma visão mais adequada de nós mesmos, esperando sempre o melhor da vida, mas sem nos entristecer quando a vida parecer apenas um pouco menos animada! Deveríamos aprender com Emma a cuidar melhor da nossa grama e parar de olhar tanto a grama do vizinho.

Uma abraço e até a próxima sessão!


sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Setembro Amarelo - Americanah



Americanah, nosso livro de hoje, foi escrito pela autora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, conta a história de Ifemelu, uma jovem nigeriana que emigra para os Estados Unidos para fazer faculdade. Lá, além de cursar a faculdade, Ifemelu usa sua inteligencia singular observando e descrevendo em um blog, as diversas formas de preconceito que ela encontra no dia a dia. O livro tem vários focos narrativos distribuídos entre passado e presente de Ifemelu, e em alguns pontos temos também a presença de Obinze como narrador. Essa multiplicidade de pontos de narração é que dá dinâmica ao livro, pois em alguns momentos, por ser uma narração de cotidiano, temos a impressão de que o livro está se arrastando.

Entretanto, quando livro é bom, o que acontece é que você pode seguir histórias de várias personagens sem necessariamente se prender naquilo que chamamos de personagem principal. No caso da livro Americanah é assim: acompanhamos também a história de Dike, primo de Ifemelu, filho da Tia Uju, uma médica nigeriana que foi amante de um general e que depois da morte do general se vê obrigada a fugir para os Estados Unidos.


Dike não conhece o pai, e assim como Ifemelu, também sofre os grandes problemas de ser um imigrante negro nos Estados Unidos. Mas os problemas de Dike se intensificam mesmo quando ele muda da cidade à qual estava habituado e vai para uma pequena cidade, de maioria branca. Dike sobre preconceito na escola, por parte dos alguns alunos e de professores também, além de outros setores da sociedade.


A solução para tudo isso surge na cabeça do personagem na forma de um vidro de tylenol e alguns comprimidos para enjoo. Um adolescente saudável que tenta suicídio. O bullying na escola talvez tenha sido o principal fator que levou o personagem a tentar contra a própria vida, mas como a narrativa é do ponto de vista de Ifemelu, o movimento que a leitura pode provocar em nós é como podemos ser mas atentos, mais observadores, para perceber o quanto uma pessoa que convive conosco está deprimida? Esta pergunta de fato não é fácil de responder, observemos as palavras de Ifemelu: 


                                                                                                                                                                                                                             "Depois que teve alta do hospital e foi para a casa, depois da lavagem no estômago e dos exames no fígado, Ifemelu observou seu rosto, seus gestos, suas palavras, procurando uma prova de que aquilo realmente quase acontecera. Dike não parecia diferente do que era antes, não tinha olheiras escuras nem um ar fúnebre"

Mesmo depois que Dike sai do hospital, Ifemelu ainda não consegue reconhecer nele os sintomas que, pelo menos no conhecimento popular, poderiam levar algumas pessoas a tentar tirar a própria vida! Se a ficção é uma imitação da vida, e se com ela podemos aprender a pensar, a que fica em busca de uma resposta talvez seja: quão próximos nós somos daquelas pessoas que nos rodeiam?

Um grande abraço e até a semana que vem! 



                                                                                     









quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Na terapia com Tolstói - ou, construindo um método de leitura para obras de ficção orientado à biblioterapia


Apresento nessa semana a nova página aqui do blog, chamada Clínica literária. Quando mergulhei no mundo internetesco em busca de inspirações para criar este blog, conheci o blog Tolstóy Therapy, escrito pela autora Lucy Horner, uma moça que acredita que a leitura pode ajudar pessoas a se sentirem melhor consigo mesmas. Enquanto leitora concordo com ela, tanto que criei este blog como objetivo de falar um pouco sobre isso.  A Clínica literária é uma tradução livre da lista elaborada pela Lucy no site dela, e constam apenas os livros que eu consegui encontrar com uma tradução em língua portuguesa. A lista original se encontra aqui! 

O problema
Enquanto bibliotecária, uma pulga saltou em minhas orelhas: como Lucy chegou à lista de livros que ela indica?

Se há algo realmente notório na bibliografia de biblioterapia é que muito se fala de seus benefícios, onde pode ser praticada, por quem pode ser guiada e a quem deve ser ministrada. Muito pouco se fala de quais livros devem ser lidos em quais situações. Além do site da Lucy, encontrei apenas mais alguns que tratam do tema desta maneria, como por exemplo o The Novel Cure e o LitTherapy, que também é coordenado pela Lucy Horner. (existem mais alguns sites, e eles serão organizados em uma coluna na lateral do blog, para facilitar a consulta, assim que o tempo me permitir!).

De todos eles, o que mais me agradou, foi o Tolstoy Therapy, pela simplicidade. Foi ele o escolhido para que eu possa fazer um pequeno estudo de como se chegam aos assuntos "médicos" aos quais determinadas obras de ficção se referem. Haverá um método de leitura específico, um guia? Dessa forma, fiz uma tradução da lista de sugestões biblioterápicas da Lucy, e dela eu expurguei todos os livros para os quais eu não encontrei tradução em língua portuguesa.

O Acervo
Isto feito, notei que alguns livros eu já possuía em minha biblioteca particular, alguns outros eu tratei logo de comprar na Bienal de São Paulo de 2016, como vocês podem ver neste post aqui! Por experiência em bienais, eu sabia que todos os livros incluídos na lista não seriam comprados, ou por falta de orçamento, ou porque os títulos não estariam disponíveis nos estandes das editoras. Ainda aproveitei uma feira do livro aqui na cidade para comprar um título que não foi encontrado na bienal. Se eu tiver a oportunidade de visitar a festa do livro da USP, tentarei comprar também alguns últimos livros por lá.

O Objetivo
Dito isto, apresento meu objetivo: quero compreender de qual forma eu posso determinar quando um livro é indicado para a leitura de uma pessoa que está com um determinado problema. Resumindo em uma pergunta: como determinar o potencial terapêutico de um livro? Tentarei fazer alguns fichamentos durante a leitura destes livros. Se alguém conhecer mais algum site sobre listas de biblioterapia, me encaminhem por e-mail ou deixem um comentário aqui embaixo!

Um grande abraço, e até a próxima!

terça-feira, 13 de setembro de 2016

Setembro Amarelo - Ana de Amsterdam



Ana Cássia Rebelo, é moçambicana, advogada, mãe de três filhos e mora em Lisboa. Convive com o tédio, a depressão, a rotina pesada, o saudosismo e relata tudo isso no blog que tem o mesmo nome do livro. (O blog era público, agora está aberto apenas para convidados, deixo o link caso um dia ele volte a ser público).

A autora relata seus dramas em posts curtos e logo no princípio do livro descobrimos que ela tentou suicídio, e que essa ainda é uma ideia recorrente na vida dela. Um exemplo é quando ela relata que rouba pílulas de sua mãe e as guarda em uma caixinha rosa no armário do banheiro, como que por segurança, caso a existência se torne insuportável novamente. Ao contrário do que vemos em livros como Anna Kariênina e Madame Bovary (deste ainda vamos falar, se tudo der certo, na semana que vem), o suicídio em Ana de Amsterdam não é efetivado, ele é falho. Ana tenta, mas não consegue dar um fim em sua própria existência. Ela então fala ao blog, como fala mesmo a um diário.



6 de junho de 2007 - "Faz hoje um ano que tomei uma caixa de Xanax", digo ao empregado do bar. Depois calo-me, estranhando as palavras que se soltaram da minha boca. Nunca ninguém me fala desse dia. Nem meu marido, nem meus irmãos. Nem os meus pais. Nem a única amiga que tenho. É como se não existisse. Como seu outra, que não eu, tivesse naquele dia rondado o bairro de Chelas à procura de espantar a dor para os homens que, sonolentos, despertavam para a manhã. Como se outra que não eu, tivesse escutado os renhaus dengosos que as mulheres lançavam das janelas dos prédios de habitação social. Às vezes tenho a sensação de que aquele dia só existiu para mim e para mais ninguém. Por isso celebro sem que ninguém o saiba, bebendo ao final do dia, num bar da rua de São Paulo.[...]

Nos casos em que a morte não acontece, o livro Ana de Amsterdam pode dar uma boa ideia do que se passa com a pessoa, tanto os sentimentos que ela tem sobre ela mesma, tanto aqueles que ela tem sobre as pessoas com quem se relaciona. Percebe-se que a vontade de morte, a percepção de que a morte é um fim de sofrimento não é afugentada pela tentativa infrutífera, ela continua ali sempre no caminho daquelas pessoas. Mesmo após a falha e suas consequências, o desejo pela morte continua ali.  E é no próprio relato de Ana que podemos talvez começar a compreender o motivo: excetuando-se os profissionais de saúde e o grupo de apoio, quase ninguém mais está disposto a falar sobre o suicídio.

Determinam os panfletos da sala de espera e do quadro de recados da igreja do bairro, onde no salão paroquial grupos de apoio se reúnem, que se fale abertamente sobre o suicídio. Ora, ignorando as cartilhas do CVV's e dos Samaritanos, ninguém fala abertamente sobre o suicídio com o suicida. As pessoas que convivem com os suicidas tendem a forçar o esquecimento, provocando um emudecimento de sentimentos que deveriam ser discutidos. Suicidas precisam falar, precisam ser ouvidos. Aos ouvintes cabe apenas ouvir com o ouvido atento, sem procurar por soluções para os problemas dos outros.

Amigos e famílias também podem sentir vergonha pelo tabu do suicídio. A vergonha poderá ser de si mesmo, pela incapacidade de perceber o real estado de espírito daquele que atentou contra a própria vida, ou poderá ser uma vergonha social, provocada pelo medo do julgamento daqueles que pensam que suicidas são loucos, e estigmatizam essas pessoas e suas famílias, condenando-as a uma existência à margem do social.

Terça -feira próxima, falaremos de um outro caso não concretizado, um pouco mais ficcional que Ana de Amsterdam! Falaremos sobre a tentativa de suicídio em Americanah!
Um grande abraço até lá!



terça-feira, 6 de setembro de 2016

Setembro Amarelo - Vamos falar sobre Anna Kariênina?




No dia 29/08, uma família foi encontrada morta em um condomínio na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. A suspeita é que o marido/pai, tenha matado esposa e filhos e depois tirado a própria vida
A tragédia, antecedeu por poucos dias o início de setembro, mês escolhido para falar sobre o suicídio. O Setembro Amarelo é iniciativa do CVV (Centro de Valorização da Vida), do CFM (Conselho Federal de Medicina) e da ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria). O trabalho com a prevenção do suicídio acontece principalmente desmistificando esse que é um tabu e ajudando pessoas a reconhecer que alguém próximo a elas pode estar pensando em cometer suicídio. O site oficial da campanha pode ser acessado aqui.

Aqui no blog, aproveitamos esse mês importante para desmistificar o tabu sobre um problema tão sério para falar um pouco sobre o suicídio na literatura. Apresentaremos algumas obras interessantes que tratam do suicídio e elencaremos algumas de suas características em comum, no final do mês.

A primeira obra apresentada, e talvez a mais emblemática para quem a escreve, pois a qualidade do texto é inquestionável é Anna Kariênina (ou Ana Karenina, ou Anna Karenina, depende da tradução. Aqui, utilizamos a edição da Cosac Naif como referência). 


Esse clássico da literatura trata, em linhas gerais, das histórias de vida de dois personagens, Anna Kariênina e Liévin, que se encontram apenas uma vez em todo o livro. Mas o foco e o título do livro recaem sobre Anna e não poderia deixar de ser, adianto, sem medo de dar spoiler, que Anna tira a própria vida no final do livro.

Anna, uma mulher casada da sociedade russa, se apaixona por um rapaz mais jovem e decide deixar o marido para viver com ele. O marido se nega a dar-lhe o divórcio. Não sendo casada com o jovem , chamado Vronski, Anna começa a sofrer o isolamento da sociedade, não sendo mais admitida nos salões, nem recebendo visitas de seus amigos.

A maternidade em Anna é questionada. Do primeiro filho, que teve com o marido, Anna não consegue esquecer e sofre por sua ausência. A segunda gestação não lhe traz a mesma alegria, e Anna não se conecta nem demonstra afeição alguma com a filha que tem com aquele homem que ela trata como o grande amor de sua vida. 

Ao final do livro, Anna Karenina sofre de um isolamento insuportável, e em uma última visita que ela faz a sua cunhada Dolly, vemos uma Anna de voz presa, que não desabafa pois naquele momento algumas coisas são simplesmente indizíveis: falar é confessar o fracasso de um grande amor. 

Sentindo que a vida saiu de suas mãos e que não há mais solução para seus medos, tomada por um ciúme doentio que sentia do companheiro (este ainda aceito em sociedade, e portanto, não sofrendo e não compreendendo o isolamento de sua companheira), e por uma saudade dilaceradora do primogênito, Anna resolve que o fim de tudo seria nas rodas de uma locomotiva. E assim o faz. 

A idéia do suicídio na cabeça de Anna tem uma dupla função: acabar com seu próprio sofrimento e ao mesmo tempo, fazer com que seu companheiro Vronski fosse tomado pela dor do remorso. Anna acredita ser  negligenciada por ele, uma vez que sacrificou a sua vida para estar com ele. É uma ideia recorrente na literatura, e vamos nos encontrar com ela ainda mais uma vez até o fim do mês, ao falar sobre Emma Bovary.

O fato que mais se destaca, para mim, nesse momento, é que Anna Kariênina pode nos mostrar como esperar que a felicidade, em nossas vidas, chegue ou por meio de um grande acontecimento ou da existência de uma outra pessoa pode ser uma grande cilada. A vida, como Tolstói parece nos dizer nesse livro, deve ser vivida buscando um equilíbrio, não um ápice, pois esse ápice é algo que nunca encontraremos.

Um grande abraço e até logo!

quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Bienal 2016 - Resumo do 2º dia!



O segundo dia que participei da Bienal foi dedicado a conhecer alguns estandes que não tive tempo de conhecer no primeiro dia, e também a assistir algumas palestras e debates com autores. Essa bienal talvez pudesse ser chamada de Bienal da Diversidade, além de estandes de livrarias, editoras, sindicatos, conselhos, também tivemos alguns estandes com propostas de divulgação, não do livro, mas de culturas e instituições. Nesse ponto, destaco o estande "Conheça o Islam". Além de belíssimo, todo decorado com luminárias marroquinas, o estande ainda contava com a presença de divulgadores muito simpáticos, e que são membros da comunidade islâmica no Brasil.

Conheça o Islam

Ainda na série "estandes de encher os olhos", dei graças aos céus por ter esquecido o cartão de crédito no hotel quando visitei o estande da Tertúlia, vendendo lindezas sobre literatura: de almofada a camiseta!



A vontade era de trazer tudo para casa: avental com citação do Guimarães Rosa (na biblioteca ia ser super), almofadas, plaquinhas, cachepôs, porta-jóias, cartão, agenda, caderno! A parte boa é que podemos encontrar tudo isso na loja virtual deles!  Tertúlia Artesanato Cultural



Menas - frente
A ocupação dos espaços da Bienal também tem alguns pontos onde você pode tirar fotos simpáticas e ostentar sua presença no evento nas redes sociais! Em outros, é possível encontrar mini-exposições com temática do livro, ou da língua portuguesa, como essa que aparece na foto ao lado, a "Menas", dedicada a colecionar erros corriqueiros que todos nós verbalizamos, e alguns de nós, escrevemos também.  A proposta era mostrar que a leitura enriquece culturalmente, mas também enriquece o falante da língua tanto quando à diversidade de palavras, quanto ao seu uso, fazendo com que a língua seja de fato compreendida como ferramenta primeira de comunicação! 

Menas - verso


Visitei ainda os estandes do Sinbiesp, do CRB8, do Instituto Iris, que estava lá divulgar sua nova campanha: 21 caes irão se aposentar nesse ano e eles precisam arrecadar fundos para a substituição dos mesmos (os cães são importados dos Estados Unidos, e além do valor do animal e dos impostos, ainda é necessário o pagamento do adestramento do cão). Da minha parte, arrematei a Iris, a corujinha mascote que já pintou lá no Instagram do Blog!


O dia foi ganhando seu efeito de fim com a fila bem grandinha que se formou na frente do mini auditório do SESC, todo mundo querendo ver o segundo dia da Tatiana Feltrin na Bienal! (Para quem não conhece, a Tatiana tem um canal no youtube em que ela conversa sobre livros! É uma booktuber pioneira no Brasil e a qualidade do conteúdo do seu canal é apenas um reflexo de toda essa experiência, super recomendo o canal dela!). Destaque para a equipe do SESC acomodando todo mundo na platéia, na escada da platéia, nos banquinhos de papelão, o auditório ficou lotado! Cheguei uma hora antes de começar e a minha senha foi a número 45! Num auditório que cabe 80!

Para finalizar digo apenas uma coisa: venha logo 2018!
Abraços e até mais!

sábado, 27 de agosto de 2016

Bienal 2016 - Resumo do 1º dia!




A Bienal começou ontem!!! \o/ Menor que na última edição, ou pelo menos assim me pareceu! Algumas setores na planta do evento foram mudados, como por exemplo a Arena Cultural e a Praça de Alimentação! Que ganharam espaços maiores! O número menor de empresas expondo livros também foi percebido por todo mundo! 

Começando pelos estandes! O que eu mais gostei foi o da Saraiva! É praticamente uma onipresença, você entra e já dá de cara com ele! E está lindo! É divido em três ambientes, sendo as laterais com livrarias e no centro um "lounge" com banco para os leitores! Além disso, tem painéis interativos para você tirar foto, deixar recado, tem até um trono exclusivo para você se sentir em Westeros sem precisar ir até a Leya!

Vista das catracas do evento: a Saraiva praticamente engole tudo no seu campo de vista!


Outro estande que vale muito a pena visitar com carinho é o da Editora Rocco! Você pode bancar a phyna e tirar foto ao lado da mesa especial da Clarice Lispector, ou soltar toda sua fanfarronice tirando fotos na plataforma da estação para o mundo do Harry Potter! Ou as duas coisas juntas! (Aproveite para tirar muitas fotos antes de chorar pelo desconto ínfimo no preço dos livros).


Apenas desejando muito levar esse abajur e essa mesa para a biblioteca em que eu trabalho! 

Para quem estava superpreocupado com comida, ontem, como o evento não estava lotado, as praças foram super bem e acomodaram os visitantes! Não foi preciso esperar horas para encontrar uma mesa nem para que seu pedido ficasse pronto! Para os que se interessam: A Casa do Pão de Queijo é o único que dos restaurantes que está vendendo café! Se não for com eles, tem um carrinho cor de rosa que vende brigadeiros e café, feito numa daquelas máquinas de cápsulas! Ah, tem também diversos carrinhos de brigadeiro, sorvete, água de coco e de açaí que estão distribuídos em meio aos corredores, caso você queira se refrescar mas esteja muito, muito longe dos restaurantes! 

Professor Leandro Karnal na Arena Cultural BNDES

Terminei o dia ontem assistindo à palestra sobre Ética e Educação com o Professor Leandro Karnal! Simpático como sempre, o professor encantou o público que lotou a Arena Cultural BNDES! Umas das inovações que a Bienal tentou utilizar esse ano foi a distribuição de senha antecipada para quem gostaria de ter seu livro autografado. Quando foi anunciado, achei uma maravilha e logo garanti as minhas, porém ontem vendo na prática como funcionou, acho que talvez não tenha sido uma boa estratégia. O que aconteceu: as senhas esgotaram super rápido no site do evento (segundo uma das moças da organização, eram 200 senhas) e na hora, pouca gente apareceu! Logo, todas as pessoas que assistiram mas que não tinham garantido sua senha antecipadamente pelo site não puderam pegar seu autógrafo com o Professor! Uma pena mesmo, vi muita gente que acabou a palestra com um gostinho de quero mais!

Algumas outras iniciativas muito legais estão no evento e que quero aproveitar hoje para conhecer! Ainda não fui, por exemplo, no estande que fala sobre cães-guia! Estandes sobre livros chineses, franceses também não visitei! Volto lá hoje, daqui a pouquinho, para completar o dia! Pretendo ver um workshop de booktubers com a Tatiana Feltrin, que só conheço por vídeo e considero pacas! E para encerrar a noite e minha visita, palestra com Pondé e Cortella (e mais autógrafos nos meus livros <3 )

Depois faço um post mais completinho com mais fotos! (Estou trabalhando do hotel, no netbook, então não consigo editar as fotos!)

sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Bienal 2016 - Minha lista de compras





Deixei este post programado por que hoje é o primeiro dia e eu estou na abertura da Bienal 2016. o/
Esta é a minha lista de compras deste ano, e está divida em:

  • Completar a coleção dos box da Nova Fronteira da Agatha Christie (missão impossível, vide orçamento);
  • Lista de recomendações biblioterápicas blog Tolstoy Therapy (pretendo trabalhar com as sugestões da Lucy,  a autora do TT, aqui no blog).

A ordem de prioridades será determinada pelo orçamento! Tenho R$ 390,00 para gastar! Por experiência em edições anteriores do evento, sei que não encontrarei disponível para compra tudo aquilo que está na minha lista, então acredito que fazer o orçamento render  não será tão terrível!

Esse ano eu vou em dois dias para a Bienal, então será mais fácil observar a variação de preços entre os estandes das livrarias com os das editoras!  Elaborei uma planilha para organizar os preços que encontrei na internet (trabalhei com os preços de capa), e deixei mas alguns campos para preencher com os preços encontrados na Bienal!

Por enquanto, a lista de compra, por editora está assim:


Vamos ver se consigo fazer tudo que planejei!
Abraço pra vocês!





quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Bienal 2016 - Kit de sobrebivência




Este post é para você que vai visitar e acabar com o dinheiro do cofrinho a Bienal do Livro! Você, que assim como eu, espera ansiosamente por dois anos para poder ter todas as suas editoras vendendo livros com descontos, e sonha em poder comprar mais enquanto segura meia duzia de livros e equilibra várias sacolas na fila do caixa de um estande qualquer!

Minha primeira Bienal foi em 2006! Transcorreu sem grandes problemas, afinal, universitária pobre sem orçamento não compra livros. Visitei muito e comprei muito pouco! Voltei com alguns exemplares dentro de uma sacola, tranquilamente!

A segunda bienal, no ano 2012, foi um pouco mais problemática, comprei poucos livros, mas ainda assim as sacolas machucaram minha mão. :(

Em 2014, no que para mim foi um ato de esperteza, e encontrei esse vídeo lindo do canal Cabine Literária. Salvou minha vida. Sério.



Uma foi a do carrinho de compras, que eu adaptei e levei minha mala de rodinhas para a Bienal. Foi a coisa mais útil que fiz, dado o tamanho da minha lista de compra. O orçamento era de 250,00 e voltei para casa com vários livros. Não me recordo se estourei o orçamento, mas sei que a mala ficou bem cheia! (sim, estourei o orçamento por motivos de LEV). Então, na lista de prioridades de coisas que devemos levar à Bienal, um dos primeiros itens é carrinho de compras ou mala de rodinha!

"Mas eu vou ficar arrastando a mala o dia todo???" - Vai por mim colega, melhor isso que quase perder seus dedos segurando sacolas nas filas quilométricas...  

Em 2014 também tivemos a questão da comida! No dia em que eu fui, as filas para comprar comida estavam simplesmente intermináveis! Além disso, a comida é cara e ruim. Um fast food piorado! E a fome apertando, apertando. Sentar? mesa para que, sentei e tomei meu lanche no chão! Então uma sugestão é: leve lanches leves que você possa comer antes do almoço para evitar todo o tumulto da praça de alimentação.

Um kit básico de sobrevivência em um dia de bienal teria:
  • Mochila;
  • Carrinho para compras ou mala de rodinha;
  • Carteira;
  • Lista de compras - principalmente se você tem um orçamento específico para gastar;
  • Mapa com localização das suas editoras preferidas;
  • Papel higiênico e lenços de papel - nunca sabemos qual será o estado do banheiro);
  • Garrafinha d'água -  sério gente, faz muito calor naquele pavilhão;
  • Comida, de preferência que seja fácil de comer (cookies, bolachas, queijo polenguinho, maçãs), nada de querer transformar a Bienal num pic-nic digno de Pinterest, tem gente demais lá dentro e você não vai conseguir comer;
  • Desodorante - sim, faz calor o suficiente para seu desodorante-anti-transpirante vencer e você ficar com pizza em baixo do braço
  • Canetas - se você pretende pegar autógrafos...
  • Máquina ou celular para foto - ano passado perdi a oportunidade de fazer uma selfie com Vader...
  • Paciência - sim, leve quase todo o estoque deste item que você possuir na sua casa, as filas das editoras são grandes e os descontos valem a pena, portanto muita paciência para não se desesperar e querer ir embora correndo. Em 2014 chegamos ao absurdo de ter uma editora (se não me engano a Record) que estava deixando os consumidores entrarem no stand por lotes! de 20 em 20!
  • Outra garrafinha d'água - eu sei que água quente é , mas até você chegar ao bebedor para reabastecer ela serve bem!

Observados estes itens, é partir para o abraço!



quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Bienal 2016 - Leandro Karnal



Entrando em ritmo de Bienal: passagens compradas, hotel reservado, lista de compra feita! Esta semana entra aqui no blog uma série de posts pré e pós Bienal, falando um pouco sobre a visitação e o que esperar dessa que é a maior feira de livros do Brasil. Uma oportunidade única para assistir palestras, encontrar pessoas e comprar livros com descontos de encher os olhos e esvaziar os bolsos. 

O destaque de hoje é a palestra na Arena Cultural, sexta-feira, às 19:00 com uma palestra sobre Ética e Educação com o Professor Leandro Karnal. Conheci o professor meio que por acaso, assistindo a um vídeo de entrevistas da Marília Gabriela, que lançou recentemente um canal no youtube. Fiquei encantada com a forma como ele fala, como desenvolve e encadeia idéias. O didatismo dele, mesmo em entrevistas, é impressionante, imagine o que aconteceria em sala de aula. Será minha primeira oportunidade de assistir a uma de suas palestras ao vivo. Já garanti minha senha da sessão de autógrafos e já coloquei o livro na mala! 





quarta-feira, 17 de agosto de 2016

As Leis de Ranganathan e a Biblioterapia


1. Os livros são escritos para serem lidos

Tente praticar o desapego. Seus clientes precisarão levar alguns de seus livros para casa. Adote um sistema simples de empréstimo e, para preservar a integridade da coleção, permita o empéstimo de um livro novo apenas com a devolução do antigo.

2. Todo leitor tem seu livro 

A leitura é uma experiencia muito pessoal, o bibliotecário/terapeuta deve sugerir livros para ler, mas sem recriminar o gosto pela leitura que o leitor tem. Ofereça leituras diferentes, sem ofender o gosto do leitor! É uma questão de bom senso e educação, ninguém gosta de ser acusado de ter péssimo gosto para qualquer coisa!

3. Todo livro tem seu leitor

Tente não levar muito a sério as prescrições de livros que brotam no mercado editorial (vale também para aquelas presentes nesse blog). A experiência será seu melhor guia para unir livros e pessoas. Invevitavelmente, você indicará livros que um leitor não irá gostar, mas o julgamento particular de um leitor não deve desmerecer o valor de um livro.

4. Poupe o tempo do leitor

A Biblioterapia faz melhor que isso: proporciona tempo ao leitor. A leitura é espaço e tempo, ela abre uma brecha no cotidiano para que o leitor possa vivenciar, experimentar uma série de novas possibilidades e dar novos sentidos a questões que se mobilizam em seu interior.

5. A biblioteca é um organismo em crescimento

Seja você bibliotecário, pedagogo ou psicólogo: seu acervo nunca deve parar de crescer. Leia muito sobre novos lançamentos, descubra autores novos, leia de tudo: do erudito ao popular e visite muito: sebos, livrarias e feiras de livro. Deixe sua biblioteca e suas referências crescerem.

Calote, ou sobre como um pequeno texto tem me ajudado a refletir sem raiva


E então você, leitor, assim como eu, uma pessoa pragmática e sempre cheia de si e cheia de querer ter razão, de repente percebe que foi passado para trás numa questão financeira e se enche de raiva.

Contextualizo: durante muitos anos, alimentei o sonho de ter minha própria casa, e consegui. Gosto de ficar em casa, de curtir a minha casa.  Mas, de uns tempos para cá algumas coisas pareciam muito fora de lugar, conclui que meu armário de cozinha estava pequeno e que eu precisaria de mais espaço.

Acreditando que ser uma boa pagadora é sempre a melhor opção (e ainda acredito nisso), juntei meu suado dinheirinho e chamei o projetista. Projeto feito, depósito feito. Prazos perdidos e a decepção se acumulando em mim até os ossos. Quase deixei que tomasse conta de mim. Somente depois de muito refletir sobre o que teria acontecido, é que pude começar a trabalhar para transformar os sentimentos ruins que já estavam me afetando fisicamente (sou o tipo de pessoa que sente raiva com o estomago). A empresa contratada foi a mesma empresa fez minha biblioteca, rack e móveis do banheiro. Naquela ocasião, paguei a vista e recebi antes do prazo. Agora, me deram um calote de quase sete mil reais. Dinheiro suado que batalhei muito para juntar.

A pergunta de partida foi: o que terá acontecido?



O texto de hoje, é apenas um fragmento, que falou diretamente comigo, veio pela lembrança das aulas de filosofia da linguagem com o Professor Miotello na UFSCar. Ignoramos, eu e a vaidade companheira, os escritos de Heráclito. Aquele que disse que "um mesmo homem não toma banho duas vezes no mesmo rio, na segunda vez não é o mesmo homem, nem o mesmo rio".

Quando da cozinha, eu não era mais a mesma cliente, a empresa também não era a mesma. O CNPJ era o mesmo, e o CPF dos proprietários também. Mas eles, proprietários, são homens, humanos e falhos, eles mudam. O armário da minha cozinha foi um momento de mudança. Meu erro foi ignorar que situações e pessoas mudam, não levei em consideração por nenhum momento que isso poderia acontecer. Os antecedentes não indicavam o que estava por vir. 

Os últimos meses tem sido de guerra constante em minha mente. A destemida e confiante pessoa que pagava os serviços a vista está cedendo lugar, aos poucos, à pessoa  prudente, porem um pouquinho mais sábia. Errei feio em não me precaver. O que fica de ensinamento é que agora, só faço compras na tok-stok, se tiver como levar os móveis para casa na hora (brincadeira).

Abraço para vocês!

quarta-feira, 10 de agosto de 2016

A biblioterapia, ou como ser restaurado por meio da leitura

Estabelecemos relações com determinadas histórias. Algumas relações são de amor, outras de ódio. As histórias podem ser as mais variadas, como por exemplo, aquele "causo" contado pelo avô, que você nunca mais esqueceu.

O fato é que, ao ouvir e ler histórias, nos conectamos de duas formas: uma com um mundo exterior, diverso, diferente de nós. E outra com nosso mundo interior. Ao conhecer uma nova história, aprendemos a ressignificar nosso mundo. Não são apenas palavras novas que entram em nosso vocabulário, mas uma riqueza de histórias de vida, que podem ter ocorrido a muito tempo, em lugares distântes, mas que se conectam com a gente, e nos ajudam a interpretar um fato, um evento marcante da vida. Muitas vezes, ouvimos de leitores, que tinham uma opinião formada sobre um determinado fato, mas que, ao conhecer um novo livro, e seu personagem, e se colocar no lugar do outro, construiu um entendimento mais ameno sobre as mazelas humanas.
"Além do prazer do texto, a leitura oferece para o leitor, por identificação e cooperação textual, por apropriação e projeção, a possibilidade de descobrir uma segurança material e econômica, uma segurança emocional, uma alternativa à realidade, uma catarse dos conflitos e da agressividade, uma segurança espiritual, um sentimento de pertencimento, a abertura a outras culturas, sentimentos de amor, o engajamento na ação, valores individuais e pessoais, a superação das dificuldades etc." (OUAKNIN, 1996, p. 18)
Quantas vezes sentimos sentimentos que não conseguimos definir, por não conhecer as palavras que poderiam expressá-los? Vejamos a seguinte passagem, tomada de empréstimo de Elisa Lispector (2005), no livro No exílio: 

Sente desabrochar em si algo assim como uma flor estranha, selvagem, que a apavora e deslumbra a um tempo. Tem sonhos esquisitos, e tristezas súbitas. Não raro contempla o próprio corpo com sensação nova e temerosa. O corpo magro entra em floração. A mente, habituada aos longos solilóquios, começa a tecer a fascinante trama. Com a atenção e os sentidos alertados, tateia, à procura de uma aplicação para as energias em ebulição, mas por toda a parte encontra portas fechadas.

Lizza, uma das personagens do livro, após sair, em fuga, pela Europa, com os pais e as irmãs, depois de enfrentarem fome, frio e doenças, chegam ao Brasil. Lizza, que saiu menina, chega uma pré-adolescente que deve, na ausência da mãe que está doente, cuidar das irmãs e do pai. Depois de todos os quiproquós de instalar-se no Brasil com  família,  Lizza tem, finalmente, tempo e disposição de espírito para prestar atenção em algo em si que não seja fome, nem frio, nem sujeira. Percebe o chegar da puberdade, mas não sabe o que é isso, portanto podemos dizer que Lizza sente, mas não compreende o que sente pois não consegue nomear o que sente. 

Quantas vezes estamos na vida como Lizza nesse momento, sentindo coisas que não conseguimos denominar? A leitura, como uma forma de biblioterapia pode ajudar pessoas a formularem com mais propriedade aquilo que elas sentem , por meio de alguns processos, como a introspecção e a cartase, mas isso é assunto para outro post!

Um grande abraço e até a próxima sessão!

Fonte: OUAKNIN, Marc-alain. Biblioterapia. São Paulo: Loyola, 1996. 341 p. Tradução de: Nicolás Niymi Campanário.
LISPECTOR, Elisa. No exílio. 3. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2005. 206 p.

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Retratos da leitura no Brasil - Motivações do Brasileiro para ler um livro

Em 2016, o Instituto Pró-livro divulgou o resultado mais recente da pesquisa "Retratos da leitura no Brasil", que traça um panorama dos hábitos dos leitores no Brasil. Entre as diversas perguntas e análises possíveis, com variantes de idade e escolaridade, tentarei fazer agora em Agosto uma série de posts comentando os pontos que considerei mais relevantes: As motivações para ler um livro, Escolha do livro por tema, Gêneros que mais gostam de ler, Lugares em que se costuma ler, Razão para não ter lido mais, O que gosta de fazer no tempo livre. 

Como tenho tendência a fazer textos imensos, vou considerar falar apenas um post sobre cada um dos itens. Em As motivações para ler um livro, dividiam as respostas em:  gosto, atualização cultural ou conhecimento geral, distração, crescimento pessoal, motivos religiosos, exigência escolar ou faculdade, exigência do trabalho ou atualização profissional, não sabe ou não respondeu.



Quanto olhamos o quadro geral de respostas, um dado chama a atenção: as pessoas que dizem que leem por gosto são um número expressivamente maior que todas as outras categorias, e ainda, as que dizem ler por distração são 5% a mais que as que dizem ler por crescimento pessoal. Isso posto, concluo duas coisas: os que leem por gosto, talvez não percebam ou não tenham ainda percebido a importância da leitura para suas vidas, a mesma coisa eu diria dos que leem por distração. Mas talvez, seja muita pretensão a minha imaginar que todas as pessoas leitoras devessem atribuir a mesma importância para a leitura.

No quesito idade, aqueles que estão no início da faixa abrangida pela pesquisa são os mais leem por gosto. Quanto maior a idade, mais decaí a leitura por gosto e mais aumenta os outros índices.
A leitura como desenvolvimento pessoal apresenta uma abrangência quase homogênea, entretanto, muito inferior à da leitura por gosto, por exemplo, e isso em qualquer faixa etária. A leitura como desenvolvimento pessoal ficou atras, inclusive, da leitura como distração.Fico imaginando as dificuldades que os leitores tem de encontrar um livro que realmente os ajude a superar determinado problemas, que os ajude a refletir sobre si e sobre o que podem fazer para melhorar sua relação com as palavras.

No quesito escolaridade, a pesquisa não deixou claro (ou eu não encontrei esse dado) se entrevistou pessoas que estão cursando determinada série ou se já a concluíram, mas acredito, de acordo com os dados apresentados, que se trate de pessoas que ainda estão cursando determinado curso. Dito isso, o resultado é muito similar ao da idade, ficando a leitura por gosto em primeiro lugar, distração e crescimento pessoal em posições secundárias.

Ouso, para concluir, lançar uma hipótese: entenderiam os leitores que crescimento pessoal tem relação com a literatura de auto-ajuda, e portanto, se algum livro não se encaixa nesta categoria, este livro não agregaria valor de crescimento a uma pessoa? Considerariam os leitores que é possível, lendo "A elegância do ouriço" ou "O Quinze", resinificar valores e ser provocado à reflexão?

A pesquisa, em sua imensidão e com todos os pontos abordados, pode ser melhor observada aqui:

sexta-feira, 29 de julho de 2016

Por que ler? - a leitura como obrigação escolar

Como um blog dedicado à leitura de literatura, precisamos pensar em possibilidades de respostas para algumas perguntinhas, como: Qual a relação das nossas vidas com as palavras? Por que alguns de nós fogem da leitura de livros, ou, quando leem, o fazem escondido?

Duas hipóteses, que para mim se complementam: a primeira, um problema na formação dos leitores. Na segunda, uma ideia de preconceito social quanto àqueles que preferem a "solidão" das leituras à outras atividades mais socializantes.

A relação das pessoas com as palavras começa desde a infância, aprendemos a falar, ou seja, aprendemos a nomear coisas, pessoas, emoções e qual a forma correta de dize-las. Depois, aprendemos como representar com sinais gráficos aquilo que dizemos, e como traduzir para a nossa mente aqueles registros que foram cunhados por outros, em síntese, aprendemos a ler e a escrever. Nesse momento preciso do aprendizado, começa nossa relação com os livros.

Na escola, professores e conselhos escolhem quais obras são as mas adequadas à leitura. Nós, alunos, começamos então a navegar nesse mar de palavras que é a literatura.

Resumindo as idéias da pesquisadora Teresa Colomer  (não vou ficar citando inúmeras vezes autor/data como uma norma ABNT,  todas as citações dessa autora são de um único livro que estará citado no rodapé.), em seu livro Andar entre livros:  a leitura literária na escola, podemos dizer que os conteúdos escolares até o Séc. XIX eram elaborados levando em consideração que a criança que tinha acesso à educação pertencia à chamada "elite ilustrada". Este grupo social, segundo a autora, teria o privilégio de ter livros em casa e suas crianças conviviam com adultos habituados à leitura. Dessa forma, cabia à escola apenas transmitir de forma organizada os conhecimentos sobre a literatura clássica e a literatura tradicional, e essa transmissão era feita por meio de manuais. 



Ainda embasados nas idéias da autora, no Séc. XX, o perfil do aluno mudou, e do material de ensino também. No primeiro, o acesso ao ensino secundário das classes mais pobres (?) da sociedade trouxe aos professores uma nova realidade de aluno: aquele que, quando chegava em casa, não tinha o mínimo ambiente necessário para o estudo. Alunos que não tinham, de escrivaninhas (um luxo) ao silêncio necessário à concentração. E nesse caso, se nem para o estudo das disciplinas consideradas "sérias" como matemática e ciências, os alunos eram respeitados em seu tempo, imaginemos o que acontecia quando o estudo era um livro literário. Uma outra mudança ocorrida foi no material de ensino: se antes, os alunos da elite recebiam manuais de literatura, agora com a obrigatoriedade de uma biblioteca escolar, eles passaram a ter acesso direto às obras. 

Mas algo permaneceu, no ensino de literatura, continuaram a cobrar dos alunos um conhecimento enciclopédico (da literaturas clássica e tradicional) em detrimento da uma competência literária. Decora-se para uma prova as características dos autores parnasianos, realistas, românticos, modernos, e muito pouco se sabe sobre as obras e a função social da literatura no período em que esses clássicos foram escritos. Diferente de somar, subtrair e multiplicar, saberes tão necessários à vida cotidiana e que aprendemos jovenzinhos, sem os quais não conseguiríamos comprar um picolé refrescante no verão, nos esquecemos da literatura tão logo fazemos a prova, e não adquirimos a competência literária necessária para saber de tudo que ela poderia nos proporcionar, se estivéssemos habituados a ler.

Temos aqui então um pequeno panorama dos problemas da formação deu um aluno leitor. Esse aluno, tornar-se-a um adulto não leitor. E eis que surge a uma das perguntas que resultaram na formação desse blog: Como formar um leitor habitual, um leitor que gosta da leitura e, sem estímulos externos, busca um livro para ler? Eis um dos grandes desafios enfrentados pelos educadores brasileiros.

A segunda hipótese do segundo parágrafo, será desenvolvida em outro dia, pois este post já está longo demais e nosso tempo próximo do fim!

Um grande abraço e até a próxima sessão!

Fonte:

COLOMER, Teresa. Andar entre livros: a leitura literária na escola. São Paulo: Global, 2007. 207 p. Tradução de Laura Sandroni.

terça-feira, 26 de julho de 2016

Por que ler? - A leitura como prazer pessoal

Afinal, o que buscamos na leitura?

Para o Professor José Morais (1996, p. 12-13), da Université Libre de Bruxelles, Bélgica,
Os prazeres da leitura são múltiplos. Lemos para saber, para compreender, para refletir. Lemos também pela beleza da linguagem, para nossa emoção, para nossa perturbação. Lemos para compartilhar. Lemos para sonhar e para aprender a sonhar. [...] Lemos até para esquecer. 
Este trecho, retirado da introdução do livro a Arte de Ler, encontramos um pequeno texto, cujo subtitulo, "A leitura, prazer pessoal", título que, mesmo não sendo o foco de todo o livro, nos ajuda a responder a pergunta inicial. O livro aborda diferente temas sobre a leitura, caminhando principalmente na direção da alfabetização, mesmo caminho percorrido por Teresa Colomer, que veremos no post de sexta-feira.

Antes de ser uma obrigação escolar, leitura deve ser prazer. Um leitor pode buscar no texto não apenas aprender sobre uma determinada escola literária e sobre a literatura como forma de arte. Os diálogos com um livro são os mais diversos. Um livro pode, desde fornecer informações sobre como plantar margaridas no jardim, te ajudar a passar o tempo no consultório do dentista, ou a passar  por momentos mais complicados da vida. 
A leitura foi muitas vezes comparada à alimentação. Conforme nossa fome e nossa disposição momentânea, a gente engole, devora, mastiga, saboreia. Ler é pastar [...], é digerir [...]. E se o texto é poético, sendo a poesia mais etérea que a prosa, ler é também respirar. (MORAIS, 1996, p. 13)
Para chegar a esse nível de cinestesia, teremos que aceitar que a leitura muda com o leitor, o livro que para alguém é bobagem, para outro é distração, e para um terceiro é revelação. A leitor que digere, que respira o texto, compreende seu ritmo, observa suas palavras, dialoga com elas. 

Nossa busca por palavras que nos tragam bem estar é latente: pipocam pela internet perfis de redes sociais com frases de inspiração, de versículos bíblicos a filósofos, passando por músicos, pintores, escultores, jornalistas. Procuramos por palavras inspiradas.

Das diversas maneiras de se ler um texto, poderíamos citar várias recomendações: à sombra de uma varanda, seja numa cadeira ou numa rede, para os que moram no tempo quente. E para quem vive no clima frio, ler enrolado na coberta com uma boa xícara de café, é bom demais! Mas, em qualquer uma dessas situações, o que se passa com livro aberto em sua frente, percorrendo linha a linha, letra a letra é que nos colocamos a trabalhar junto com o autor. Nas palavras de Heloísa Seixas (2011, p. 7):
Lendo, somos cúmplices, coautores, temos a chance de criar, em nossa mente, aquilo que o autor tenta nos transmitir com palavras. Ler é, portanto, um exercício de liberdade quase tão amplo quanto pensar. É uma pena que nem todos nós sejamos capazes de fazer isso com prazer.
Editado pela Casa de Palavas, O prazer de ler é um pequenino livro da Heloísa Seixas, que consegue, em poucas palavras encantar leitores com suas observações sobre os diversos prazeres que encontramos na leitura. Recomendo conhecer este pequeno grande manual! Ainda falaremos muito sobre ele!

Um grande abraço e até a próxima!


Fontes:

MORAIS, José. A arte de ler. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1996. 327 p. (Encyclopaidéia). Tradução de Álvaro Lorencini.
SEIXAS, Heloísa. O prazer de ler. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2011. (Prazeres).