sexta-feira, 29 de julho de 2016

Por que ler? - a leitura como obrigação escolar

Como um blog dedicado à leitura de literatura, precisamos pensar em possibilidades de respostas para algumas perguntinhas, como: Qual a relação das nossas vidas com as palavras? Por que alguns de nós fogem da leitura de livros, ou, quando leem, o fazem escondido?

Duas hipóteses, que para mim se complementam: a primeira, um problema na formação dos leitores. Na segunda, uma ideia de preconceito social quanto àqueles que preferem a "solidão" das leituras à outras atividades mais socializantes.

A relação das pessoas com as palavras começa desde a infância, aprendemos a falar, ou seja, aprendemos a nomear coisas, pessoas, emoções e qual a forma correta de dize-las. Depois, aprendemos como representar com sinais gráficos aquilo que dizemos, e como traduzir para a nossa mente aqueles registros que foram cunhados por outros, em síntese, aprendemos a ler e a escrever. Nesse momento preciso do aprendizado, começa nossa relação com os livros.

Na escola, professores e conselhos escolhem quais obras são as mas adequadas à leitura. Nós, alunos, começamos então a navegar nesse mar de palavras que é a literatura.

Resumindo as idéias da pesquisadora Teresa Colomer  (não vou ficar citando inúmeras vezes autor/data como uma norma ABNT,  todas as citações dessa autora são de um único livro que estará citado no rodapé.), em seu livro Andar entre livros:  a leitura literária na escola, podemos dizer que os conteúdos escolares até o Séc. XIX eram elaborados levando em consideração que a criança que tinha acesso à educação pertencia à chamada "elite ilustrada". Este grupo social, segundo a autora, teria o privilégio de ter livros em casa e suas crianças conviviam com adultos habituados à leitura. Dessa forma, cabia à escola apenas transmitir de forma organizada os conhecimentos sobre a literatura clássica e a literatura tradicional, e essa transmissão era feita por meio de manuais. 



Ainda embasados nas idéias da autora, no Séc. XX, o perfil do aluno mudou, e do material de ensino também. No primeiro, o acesso ao ensino secundário das classes mais pobres (?) da sociedade trouxe aos professores uma nova realidade de aluno: aquele que, quando chegava em casa, não tinha o mínimo ambiente necessário para o estudo. Alunos que não tinham, de escrivaninhas (um luxo) ao silêncio necessário à concentração. E nesse caso, se nem para o estudo das disciplinas consideradas "sérias" como matemática e ciências, os alunos eram respeitados em seu tempo, imaginemos o que acontecia quando o estudo era um livro literário. Uma outra mudança ocorrida foi no material de ensino: se antes, os alunos da elite recebiam manuais de literatura, agora com a obrigatoriedade de uma biblioteca escolar, eles passaram a ter acesso direto às obras. 

Mas algo permaneceu, no ensino de literatura, continuaram a cobrar dos alunos um conhecimento enciclopédico (da literaturas clássica e tradicional) em detrimento da uma competência literária. Decora-se para uma prova as características dos autores parnasianos, realistas, românticos, modernos, e muito pouco se sabe sobre as obras e a função social da literatura no período em que esses clássicos foram escritos. Diferente de somar, subtrair e multiplicar, saberes tão necessários à vida cotidiana e que aprendemos jovenzinhos, sem os quais não conseguiríamos comprar um picolé refrescante no verão, nos esquecemos da literatura tão logo fazemos a prova, e não adquirimos a competência literária necessária para saber de tudo que ela poderia nos proporcionar, se estivéssemos habituados a ler.

Temos aqui então um pequeno panorama dos problemas da formação deu um aluno leitor. Esse aluno, tornar-se-a um adulto não leitor. E eis que surge a uma das perguntas que resultaram na formação desse blog: Como formar um leitor habitual, um leitor que gosta da leitura e, sem estímulos externos, busca um livro para ler? Eis um dos grandes desafios enfrentados pelos educadores brasileiros.

A segunda hipótese do segundo parágrafo, será desenvolvida em outro dia, pois este post já está longo demais e nosso tempo próximo do fim!

Um grande abraço e até a próxima sessão!

Fonte:

COLOMER, Teresa. Andar entre livros: a leitura literária na escola. São Paulo: Global, 2007. 207 p. Tradução de Laura Sandroni.

terça-feira, 26 de julho de 2016

Por que ler? - A leitura como prazer pessoal

Afinal, o que buscamos na leitura?

Para o Professor José Morais (1996, p. 12-13), da Université Libre de Bruxelles, Bélgica,
Os prazeres da leitura são múltiplos. Lemos para saber, para compreender, para refletir. Lemos também pela beleza da linguagem, para nossa emoção, para nossa perturbação. Lemos para compartilhar. Lemos para sonhar e para aprender a sonhar. [...] Lemos até para esquecer. 
Este trecho, retirado da introdução do livro a Arte de Ler, encontramos um pequeno texto, cujo subtitulo, "A leitura, prazer pessoal", título que, mesmo não sendo o foco de todo o livro, nos ajuda a responder a pergunta inicial. O livro aborda diferente temas sobre a leitura, caminhando principalmente na direção da alfabetização, mesmo caminho percorrido por Teresa Colomer, que veremos no post de sexta-feira.

Antes de ser uma obrigação escolar, leitura deve ser prazer. Um leitor pode buscar no texto não apenas aprender sobre uma determinada escola literária e sobre a literatura como forma de arte. Os diálogos com um livro são os mais diversos. Um livro pode, desde fornecer informações sobre como plantar margaridas no jardim, te ajudar a passar o tempo no consultório do dentista, ou a passar  por momentos mais complicados da vida. 
A leitura foi muitas vezes comparada à alimentação. Conforme nossa fome e nossa disposição momentânea, a gente engole, devora, mastiga, saboreia. Ler é pastar [...], é digerir [...]. E se o texto é poético, sendo a poesia mais etérea que a prosa, ler é também respirar. (MORAIS, 1996, p. 13)
Para chegar a esse nível de cinestesia, teremos que aceitar que a leitura muda com o leitor, o livro que para alguém é bobagem, para outro é distração, e para um terceiro é revelação. A leitor que digere, que respira o texto, compreende seu ritmo, observa suas palavras, dialoga com elas. 

Nossa busca por palavras que nos tragam bem estar é latente: pipocam pela internet perfis de redes sociais com frases de inspiração, de versículos bíblicos a filósofos, passando por músicos, pintores, escultores, jornalistas. Procuramos por palavras inspiradas.

Das diversas maneiras de se ler um texto, poderíamos citar várias recomendações: à sombra de uma varanda, seja numa cadeira ou numa rede, para os que moram no tempo quente. E para quem vive no clima frio, ler enrolado na coberta com uma boa xícara de café, é bom demais! Mas, em qualquer uma dessas situações, o que se passa com livro aberto em sua frente, percorrendo linha a linha, letra a letra é que nos colocamos a trabalhar junto com o autor. Nas palavras de Heloísa Seixas (2011, p. 7):
Lendo, somos cúmplices, coautores, temos a chance de criar, em nossa mente, aquilo que o autor tenta nos transmitir com palavras. Ler é, portanto, um exercício de liberdade quase tão amplo quanto pensar. É uma pena que nem todos nós sejamos capazes de fazer isso com prazer.
Editado pela Casa de Palavas, O prazer de ler é um pequenino livro da Heloísa Seixas, que consegue, em poucas palavras encantar leitores com suas observações sobre os diversos prazeres que encontramos na leitura. Recomendo conhecer este pequeno grande manual! Ainda falaremos muito sobre ele!

Um grande abraço e até a próxima!


Fontes:

MORAIS, José. A arte de ler. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1996. 327 p. (Encyclopaidéia). Tradução de Álvaro Lorencini.
SEIXAS, Heloísa. O prazer de ler. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2011. (Prazeres).